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Um pássaro sem poiso

Palavras soltas, livres, voando por aí

Um pássaro sem poiso

Palavras soltas, livres, voando por aí

31.10.19

Não sou poetisa


Isa Nascimento

Tenho de reconhecer que não sou poetisa. A minha “veia” não é suficientemente poética… Navegando nesta arte expressiva a que chamamos poesia, constato invariavelmente que a minha escrita é demasiado ingénua, demasiado “terra-a-terra”. Talvez por isso me tenha habituado a chamar-lhe pseudopoesia.

Cheguei a participar em alguns concursos de poesia, até que me rendi às evidências e desisti 

Durante esse processo encontrei muitos poemas transbordantes de imagens e analogias surpreendentes, que tornavam os meus ainda mais simplistas.

Como poderia eu competir contra versos como…

aviao de papel.png

Luís Aguiar, in "Quantas Madrugadas Precisamos Para Fermentar Um Pão?"

 

Admiro imenso quem tem esta capacidade de se exprimir por metáforas cheias de ritmo, criando versos ricos em recursos estilísticos que soam tão bem que nos embalam durante a leitura.

Infelizmente, quando chego ao fim do poema já me esqueci do que me diziam os seus versos.

Não me ficam sentimentos para me recordar deles. Não os compreendo e, por não compreender, não me transmitem coisa alguma.

Sei que o “problema” está em mim. Eu é que não tenho a capacidade imaginativa necessária para entender o significado de

Amor, o sol ainda é um fruto vermelho / que amadureceu o barro de que é feito o meu corpo – / carne antiga despida de centauros / e resina de campos embriagados por aves solares.

 

Assim, tal como não tenho capacidade para o entender, também não tenho imaginação para o escrever.                

Não, definitivamente nunca serei poetisa, sou demasiado simplista e assertiva na minha escrita. Os meus versos são demasiado claros, límpidos. Não conseguirei dizer coisas complexas e musicais como “aconchego de palha e sal” ou “oração sem mãos”.

As minhas mãos não “comem” nem “bebem”, apenas escrevem, sentem, gelam, estremecem… São demasiado naturalistas para serem mãos de uma poetisa.

Admito, prefiro poemas que falem comigo. Que conversem com o meu íntimo, fazendo-me sorrir ou chorar, permitindo-me recordar o que senti quando os li.

                                                                                                                                                    

Alberto Caeiro diz, em “A espantosa realidade das coisas”:

Eu nem sequer sou poeta: vejo.

Se o que escrevo tem valor, não sou eu que o tenho:

O valor está ali, nos meus versos.

Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade.

 

Como o compreendo! No meu caso seria:

Eu não sou poetisa: sinto.

Se o que escrevo tem valor

É porque escrevo o que sinto:

O valor está na verdade dos meus versos

Porque o que sinto é absolutamente independente da minha vontade.

 

Os poemas de Alberto Caeiro conversam sempre comigo, por isso o aprecio de forma muito especial:

a mentira esta em ti.png

 

30.10.19

Também não te custava nada responder!


Isa Nascimento

Não gosto de me irritar. Acho a irritação um desperdício de energias e uma perda de tempo.

Mas tenho de confessar, quando convido uma amiga para um lanche num sábado próximo e ela me ignora, respondendo de imediato com uma imagem do tipo "corrente solidária" que termina num "Não custa nada!"...

Ou quando ela acaba de me enviar uma dessas mensagens que eu agradeço logo de seguida (mesmo logo a seguir!), perguntando-lhe se está bem e já não me responde…

Irra! Tenho de invocar todas as minhas técnicas zen para não ripostar “também não te custava nada responder!”.

Apre! Que vontade de fazer uma birra!

birra.jpg

Imagem de Points Of You

 

 

30.10.19

Apropriação da verdade


Isa Nascimento

Há pessoas que se consideram detentoras da verdade.

Conheço várias assim, homens e mulheres. Não haveria nada de especial em se considerarem donas da verdade, não fora o facto de acharem que têm o dever moral de trazer clarividência à vida dos outros. Essas pessoas estão tão convencidas de que a sua verdade é “A” verdade certa, que se conferem a si próprias a missão de convencerem aqueles que as rodeiam de que vivem numa verdade errada.

Eu tenho convicções sólidas, posições bem definidas em relação a muitas coisas práticas da vida, como a alimentação e a sua relação com a saúde e a doença, mas também em relação a muitas ideologias e correntes de pensamento. Contudo, reservo-as para mim. Mesmo quando as partilho, gosto de esclarecer que é o que “eu” penso, o que “eu” sinto, aquilo em que “eu” acredito.

E sei, cada vez mais claramente, que aquilo que faz sentido para mim poderá não fazer para mais ninguém. Isto é ainda mais óbvio quando falamos em ideologias, sentimentos, gostos…, enfim, quando abordamos aquelas coisas que “não se veem”. Porém, os factos ditos objetivos e cientificamente comprováveis também podem originar uma discussão bem acesa. Fala-se muito em evidências e em factos, como se não pudessem ser manipulados para comprovar o que se pretende ou igualmente passíveis de interpretações diferentes ou potencialmente opostas.

 

“Vês o que queres ver”, alguém me disse recentemente.

Não seremos todos assim?

A verdade é uma mera questão de perspetiva.

perpetiva.jpg

Imagem de Points Of You

 

29.10.19

Os dias sempre iguais


Isa Nascimento

Uma velha antena de televisão

abana no topo do telhado

Fustigada pelo vento e pela chuva

enferrujada e oscilante

Vergada ao sabor do vento

e da intempérie

 

De braços abertos,

pedindo ajuda

ou agradecendo a resiliência

que lhe permite aguentar

as sovas da tormenta

o peso dos vendavais

os dias sempre iguais

 

Março de 2018

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28.10.19

Nos dias cinzentos


Isa Nascimento

Nos dias cinzentos acinzento-me eu também

Esvaida de luz

Vazia de vontade

De braços caídos

 

Nesses dias em que não encontro o sol

Também não me encontro a mim

Minha alma deambulando por aí

Desanimada, perdida

 

Deixo-me ficar rendida, imóvel

Aguardando que o céu desanuvie

Clareando-me também o espírito

Dissipando as nuvens de chuva e de lágrimas

 

Maio de 2018

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27.10.19

A melhor piza, o melhor pastel de nata e o melhor leitão… é o que dizem…


Isa Nascimento

Assim vivemos, em constante competição e comparação uns com os outros.

Porque não vivemos, simplesmente, o melhor que somos capazes?

Não seria melhor que competíssemos apenas connosco próprios, procurando todos os dias ser melhores pessoas do que fomos no dia anterior?

 

Não entendo esta necessidade desenfreada de mais e melhor. Sempre mais e melhores férias, roupas, carros, casas, restaurantes…

Até as notas dos filhos e as presenças nos quadros de mérito da escola são escarrapachadas nas redes sociais para que toda a gente saiba que os nossos filhos são os melhores.

 

E eu pergunto-me… será que essas notas vêm acompanhadas de felicidade?

Aquela criança tem tempo para brincar e desfrutar da sua infância tão preciosa?

Será que as notas são fruto de um gosto pelo desafio da superação, ou servem apenas para agradar aos pais e ganhar o “rótulo” do melhor?

 

Eu recordo a mim própria todos os dias que, invariavelmente, ter demasiado ou colocar a fasquia muito alto traz preocupações acrescidas. Quanto mais longe chegamos na posse de bens materiais e no sucesso profissional, maior é o preço emocional a pagar. É preciso conseguir equilibrar os pratos da balança.

 

Enquanto criarmos e educarmos as nossas crianças com base em padrões comparativos puramente quantitativos e materialistas, o futuro da humanidade estará seriamente comprometido.

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