Sou uma árvore, de copa frondosa, ampla, pronta a acolher todos na sua sombra. As minhas raízes profundas prendem-me bem à terra, por isso deixo que se agarrem a mim em busca de segurança, abrigando quem me procura.
Vergo durante a tempestade, perco as minhas cores exuberantes nos invernos mais tristes. De vez em quando solto um ou outro ramo, que deixo ir sem pena por saber que já não preciso dele, nem ele de mim. Também já perdi ramos antigos, que nutri durante muitos anos e cuja perda me fez derramar rios de lágrimas que cheiravam a tristeza e a amor. Mas, como sou uma árvore e as árvores são resilientes, deixei que a minha casca protetora crescesse e sarasse as feridas deixadas pelos ramos partidos, voltando a minha atenção para os ramos que ainda tinha. E assim fui crescendo, cada vez mais forte e exuberante.
Contudo, como qualquer árvore, preciso de espaço para que os meus ramos cresçam livremente, no sentido que quiserem, tão longe quanto conseguirem. Esse espaço pode estar cheio de pessoas, que alimentam a minha essência comunicativa, mas também pode estar vazio. No vazio da solidão reencontro-me e regenero a seiva vital que percorre todos os meus ramos e todas as minhas raízes. Por isso me sinto em paz no meu jardim, ao entardecer, quando o ar se torna mais puro e a água mais fresca, quando o silêncio da ausência de vozes e risos me permite divagar e viajar por um mundo que é só meu. Um mundo em que estou em sintonia e união perfeita com todos os elementos, todas as energias e todos os espíritos que caminham sobre a terra.
Às vezes aparece um jardineiro para me podar os ramos, querendo controlar a minha natureza de árvore indomável e selvagem, e durante uns tempos deixo que o pobre jardineiro faça o seu trabalho. Mas depois canso-me. Não sei ser outra coisa para além de ser uma árvore orgulhosa, que ruidosamente abre os seus ramos e diz, eu sou assim e estou aqui “para o que der e vier”. Nessa altura, o jardineiro perde a paciência por não conseguir calar as palavras gravadas nos meus ramos, que voam pelo mundo quando as minhas folhas caem no outono, e percebe que não há forma de podar a inconstância de uma árvore teimosa.