Analisava sem parar os sinais do passado e do presente. As noites tornaram-se um inferno. Havia lido que, quando se escolhe um parceiro para partilhar a vida, deve procurar-se alguém com quem se consiga conversar, pois a certa altura da vida já nada mais haverá para fazer a dois.

Os degraus das escadas ainda estão molhados

Choveu durante a noite

E o sol ainda não teve tempo de os secar

Penso que não está seguro de o fazer ou não

Vem e vai conforme lhe apetece

Como se brincasse às escondidas comigo

Ora escondendo-se a trás das nuvens

Ora revelando-se em todo o seu esplendor

Está indeciso, o sol

E as nuvens indecisas estão

Para não falar da chuva

Cujo génio imprevisível

Nos tem a todos reféns

Tudo me parece às avessas

O mundo a involuir

Os elementos sem tempo certo

O inverno misturando-se com a primavera

A guerra a paredes meias com a paz

Nos degraus ainda molhados

Ora soalheiros, ora ensombrados

Imagino que estou noutro mundo

Um mundo desconcertado

Habitado por mentes desacertadas

Que deixarei para trás quando regressar a casa

Como se deixa um pesadelo

No alívio do despertar

Uma brisa suave afaga o meu cabelo

Enquanto o sol me beija novamente

E tudo o que desejo é que a chuva espere um pouco

Que seja benevolente esta manhã

Porque está cheio o meu estendal

Muito mais do que isso desejarão

Homens e mulheres tão longe de mim

Mas que tão perto sinto cá dentro

Que a pequenez do meu pedido à chuva

Se agiganta e me sufoca num tormento

Porque não é outro mundo este em que estou

É real este pesadelo de incerteza

De vidas suspensas e ações obscuras

De mais uma gigantesca nódoa

Na história da humanidade

Março de 2022

Poesia

É uma melodia que embala

Ao ritmo do canto das sereias.

É uma recordação que abala

Revelando o que anseias.

É êxtase, é bocejo,

É espanto e cansaço.

Pode até ser um gracejo

Vertido num copo de bagaço.

É o mar e o barco à vela a navegar,

O céu e a gaivota a esvoaçar.

É a nascente e o poente,

O amor e a lua ausente.

É o tudo e o quase nada,

Uma canção nunca cantada.

É o que pesa e o que liberta

O grito da saudade que aperta.

Março de 2021

I wish I could talk about the moon

And the birds and the blossoming flowers.

Now that springtime is arriving

It would be logical and coherent.

But I often lack logic or coherence

So I would rather speak about

The clouds I can see

In the cloudless sky,

And the mist that floods my heart

Infecting my soul,

And the fog that invades my eyes

Preventing me from seeing clearly.

I try to focus

In vain

Unsuccessfully,

Asking for help

From the brightening sun,

Trying to absorb its energy

To reinvigorate myself

With discernment and belief.

But I fail to see the light ahead

And get lost in the way

While I hope and quit hoping

Over and over again.

Maio de 2016

Nas linhas alinhadas

do meu caderno

plasmo o meu desalinho.

No branco imaculado do meu caderno

deixo a mácula infame

escrita pelo meu punho.

Soubera eu, ao invés,

desenhar flores e não letras,

sem linhas era o meu caderno

e eu sem desalinho.

Novembro de 2019

Não me desejem um "Feliz Dia da Mulher"!

Não me deem nada.

Porque eu tenho sorte. Não me sinto injustiçada.

Recordem aquelas que o são.

Ajudem aquelas que precisam.

Lembrem-se do que acontece no Afeganistão...

Homenageemos as vítimas! 

O coração bate acelerado.

As mãos tremem descontroladamente.

Mas avançamos de qualquer forma. 

@umpassarosempoiso